O projeto da Semente ao Artefato propõe uma investigação sensível e técnica sobre sementes e frutas nativas brasileiras, entendidas aqui não apenas como elementos biológicos, mas como biofatos: objetos híbridos, vivos, técnicos e simbólicos que condensam histórias, saberes e futuros possíveis. Em um momento marcado por colapsos ambientais e desconexão entre humanos e não-humanos, esta pesquisa se inscreve como uma tentativa de diálogo entre espécies, usando o design como ferramenta de escuta.

Esta investigação se debruça sobre formas de tornar visível, tátil e acessível a expressão de formas da flora brasileira. Seu foco está na morfologia dos frutos e sementes, suas curvas, texturas, mecanismos de dispersão, e em como essas formas podem ser registradas e traduzidas por meio de tecnologias tridimensionais, criando arquivos digitais, materiais e poéticos. O objetivo não é apenas científico ou documental, mas também epistemológico e artístico.

A pesquisa articula práticas de escaneamento 3D com processos manuais e observações. Cada semente é registrada em dois níveis: o técnico, com dados sobre captura e digitalização; e o sensível, por meio de um diário cartográfico onde são narradas impressões subjetivas, ruídos do processo, imagens evocadas e desvios criativos. Essa abordagem híbrida é inspirada em metodologias como Research Through Design, que reconhecem o conhecimento como algo que emerge da prática, do corpo em ação, da relação com a matéria.

Além disso, o projeto prevê colaborações com instituições científicas e botânicas, como o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, buscando cruzar dados morfológicos com saberes etnobotânicos e ecológicos. A proposta de construção de um acervo tridimensional digital de sementes nativas, visa colaborar com a valorização e proteção da biodiversidade brasileira, oferecendo ferramentas que unem arte, ciência para a divulgação científica e cultural do patrimônio biológico.

Mais do que um inventário de formas, este trabalho é também uma reflexão sobre os modos de conhecer e cuidar. Ele parte de uma hipótese fundamental: sementes, compreendidas como biofatos, são dispositivos de futuro. São elas que carregam os códigos da regeneração, da adaptação e da persistência da vida. E, ao serem estudadas com atenção, com tentativas sinceras de tradução por meio do design, podem nos ensinar outras formas de relação com o mundo.

O projeto, portanto, é também uma proposta ética e estética de escuta. Uma tentativa de afinar o olhar e o fazer para aquilo que pulsa em silêncio no interior de uma semente: a memória de um território, a inteligência de uma espécie, a possibilidade de um futuro compartilhado entre humanos e mais-que-humanos.
devir vegetal
estudos, ensaios, experimentos,
obras, criações e diálogos com
a estética vegetal
Descobrir uma planta ou um novo sapo é um acontecimento estético, já que o mundo começou a conhecer uma nova coisa "real" que amplia o território da forma e da representação possível.
Efrén Giraldo, Sumário de Plantas Oficiosas
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diário cartográfico
registro de vivências, aprendizados e experimentos fluidos
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